Com
o desenvolvimento do Brasil colônia, temos uma maior ocupação do campo e
consequentemente, conflitos sociais, de forma que os primeiros que podemos
citar envolvem índios vitimados em massacres oriundos desta ocupação, onde o
território até então indígena, quando conquistado, se torna capitalista. Em
outras palavras, onde o espaço-tempo (universo cultural) do índio se torna
espaço-tempo do capital. Nesse sentido, podemos nos perguntar se há de fato uma
luta pela terra ou se há uma luta do capital para se reproduzir porque o
processo histórico de lutas no Brasil remota aos conflitos por espaço-tempo de
ocupação e usos diferentes. Podemos em uma ligeira adaptação, comparar os
nativos (indígenas) à sociedade contemporânea e, os colonos aos Estados
internacionais que intentam o uso, posse e domínio da terra dentro do nosso
território. Se formos falar dos indígenas especificamente, as terras (reservas)
onde são confinados, são uma fração mínima daquilo que por direito lhes
pertence.
As
fugas dos indígenas que se opunham a escravidão criou um rota de migração onde
se pode citar confrontos mesmo entre os povos e grandes alterações em sua
cultura. Enquanto o índio busca o espaço-liberto dentro do tempo lunar, o
invasor instaura o espaço-prisão e o tempo do relógio, ou o tempo de produção.
É
ainda sob a luz da luta indígena que nasce a luta do negro, contrabandeado da
África e escravizado no Brasil. É sob a conquista e devastação do território
indígena que nascem e se reproduzem novas formas de organização de comunidades,
com produção e posse da terra coletiva, ao largo do ideal de propriedade
privada e produção do capital. “ (...) a capacidade de resistência e de
reconstrução desses expropriados na busca pelo espaço livre onde possam ser
proprietários coletivos de um tempo descompromissado com o relógio
capitalista”.
Como
forma mais avançada de organização, destaca-se a COTAG (Confederação Brasileira
dos Trabalhadores da Agricultura) enquanto por outro lado Estatuto da Terra impõe a paz no campo
através da guerra, sendo favorável aos especuladores rentistas e aos setores
nacionais do capital internacional, agora territorializados.
O
numero de mortos no campo foi gradativamente aumentando e, agora organizados,
não somente os posseiros, mas também lideres sindicais e aqueles que os
apoiavam ou defendiam feneciam ao poderio do proletariado.
No
poder, o Congresso constitui-se de proprietários, latifundiários e rentistas,
por isso as políticas aplicadas à terra tendem a beneficiar a classe dominante.
Das
violências e injustiças no campo, urge a necessidade de uma organização que se
articulasse de acordo com a conjuntura político-economica, dessa contradição
nasce, por exemplo, o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). “A
negação e a expropriação é agora pensada, articulada e executada a partir da
cidade, com a presença dos retirantes a quem a cidade-sociedade insiste em
negar o direito à cidadania. Direito agora construído e conquistado na luta
pela recaptura do espaço-tempo perdido na trajetória histórica da expropriação.
(...) acampamentos e assentamentos são novas formas de lutas pela terra livre e
pelo trabalho liberto empreendida pelos donos do tempo que o capital roubou”. E
assim, nos acampamentos e assentamentos, camponeses, peões e bóias frias estão
sendo politizados em uma aliança histórica onde a compreensão da realidade
mostra a distribuição territorial desigual.
CONFLITOS SOCIAIS NO CAMPO – UM HISTÓRICO
As lutas que vem da tentativa dos
vencidos de acabar com as injustiças no país são tantas e tão trágicas que a
população em geral chega a ser indiferente diante dos números casos de
violência e morte no campo.
Lutas no tempo da escravidão
Os quilombos eram um sistema
comunitário de vida na floresta onde se concentrava a resistência negra. Eram
perseguidos pelos exércitos dos fazendeiros em seus territórios livres. O maior
quilombo foi o de Palmares que resistiu por mais de 100 anos graças a
capacidade de organização e a liderança de Zumbi. Palmares chegou a ter 20 mil
habitantes e funcionava num sistema de comunidade e fraternidade, onde a posse
da terra era coletiva, bem como a produção. Seu algoz foi Domingos Jorge Velho.
Temos ainda a guerra de Canudos
na Bahia em fins do século XIX e a guerra do Contestado no Paraná e Santa
Catarina que, nos anos 10 configurou-se como o maior conflito civil armando no
país.
Lutas dos colonos nas fazendas de café
Os migrantes explorados nas
fazendas de café (colonos) iniciaram seus movimentos com inúmeras greves que na
maioria das vezes eram abafadas. As relações do colonato há muito estavam
deterioradas e a exploração da mão de obra culminou nas greves que eram
dominadas pela ameaça dos fazendeiros de expulsão ou supressão de alimentos.
As lutas camponesas de meados do século XX
Palmares, Canudos, Contestado e
as greves nos cafezais fomentaram movimentos sociais no campo tanto pela
propriedade da terra quanto por liberdade de produção e condições dignas de
trabalho. O conflito agora é entre camponeses autônomos e posseiros contra a
expropriação oriunda dos fazendeiros e grileiros, sendo que os camponeses
unidos aos moradores passaram a ter maior poder de resistência contra a
expropriação que os transformava em assalariados. É quando começam a surgir as
ligas camponesas no nordeste.
Trombas e Formoso – Goiás 1948
A estrada Transbrasiliana que
futuramente seria a Belém-Brasília valorizou as terras do entorno e ao longo
desse processo, atraiu camponeses vindos do norte que ocuparam as terras
devolutas que, mais tarde foram griladas por um grupo de fazendeiros que
queriam comprar as terras dos camponeses pagando por elas somente o valor das
benfeitorias. Entram em cena os militantes do partido comunista trazendo
propostas de organização para os camponeses que até 64 continuaram ali vivendo
em um território livre com governo próprio graças a acordos e arranjos
políticos. Depois do golpe militar, a coisa ficou preta.
Paraná
A corrupção do próprio governo
com interesse particular na especulação das terras, junto com as discrepâncias
entre governo federal e estadual sobre o destino dessas terras, culminaram em
conflitos onde até mesmo os camponeses que pagaram pela terra foram
expropriados como posseiros, houve aí também uma forte influencia do Partido
Comunista.
Formação das Ligas Camponesas
Nas décadas de 50 e 60
difundiram-se as lutas pela terra em território nacional. Na época, os
sindicatos rurais eram inconstitucionais. As primeiras ações são no Engenho da
Galileia a 60km de Recife contra a elevação absurda do foro (preço do arrendamento),
pois a produção dos camponeses era de subsistência + mercantil (legumes,
frutas, mandioca e algodão). Ali concentrada ainda no Nordeste, as Ligas
Camponesas tinham o apoio do Partido Comunista e a oposição da Igreja. Contudo,
a tomada de consciência dos camponesas quanto ao subdesenvolvimento do nordeste
e das políticas do governo que só beneficiavam os fazendeiros foram suficientes
para fazer com que o movimento se fortificasse para ser difundido a nível
nacional. Alem disso, o latifúndio e a miséria obrigaram os camponeses a
migrarem para o sul.
ULTAB e Ligas Camponesas
O cenário agora é o capitalismo e
tendências esquerdistas. Enquanto as Ligas Camponesas buscavam uma reforma
agrária radical, a ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do
Brasil) coordenava as ações camponesas, basicamente coordenava os sindicatos
agora que os antigos coronéis estavam enfraquecidos politicamente. Dois grupos de excluídos dominam o cenário
das lutas: os foreiros em vias de expulsão e os trabalhadores que vinham se
tornando assalariados e perdendo as características camponesas.
Neste período já contamos com a
CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), mas os direitos sindicais não
abrangiam todo o território nacional. Era o Ministério do Trabalho que reconhecia
e legitimava os sindicatos, isso acarretava burocracias e tornava mais fácil
organizar uma sociedade civil do que um sindicato.
O crescimento das greves e
assassinato dos líderes motivava a maior comoção dos movimentos sociais e sua
homogeneização no território. A partir do Golpe de 64, os militares instauraram
a perseguição, prisão e desaparecimento das lideranças das Ligas Camponesas e
foi assim, desarticulada que se deu seu fim.
OLIVEIRA, Ariovaldo Ubelino de. A Geografia das lutas no
campo. 6ª ed. – São Paulo: Contexto, 1994 (Coleção Repensando a Geografia).
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