A DES-ORDEM
ECONÔMICA MUNDIAL: A NOVA DIVISÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO
As mudanças ocorridas na economia
nas ultimas décadas, podem demonstrar como o jogo de poder mundial está
subordinado aos interesses do grande capital e das grandes corporações transnacionais,
sem falar nos organismos internacionais que atuam como verdadeiros gerentes da
economia global, em especial o capital financeiro, como o Banco Mundial e o
Fundo Monetário Internacional.
Ernest Mandel, um dos teóricos de
fundamentação marxista que melhor discutiu essa questão, afirma que: o
andamento cíclico do modo de produção capitalista ocasionado pela concorrência
manifesta-se pela expansão e contração sucessivas da produção de mercadorias e,
consequentemente, da produção de mais valia.
Constitui-se assim, uma nova divisão
internacional do trabalho cuja espacialidade pode nos revelar muito,
especialmente no que se refere ao poder de transformação das novas tecnologias,
às novas formas de intervenção das grandes corporações e à desconstituição de
sujeitos coletivos por meio da desconstrução da organização dos trabalhadores e
outros grupos sociais.
De acordo com a teoria dos ciclos, a
periodização mais simples apresentada por L. Harris, que distingue três grandes
etapas do capitalismo: o capitalismo concorrencial, o capitalismo monopolista e
o capitalismo monopolista de Estado (para alguns, os dois últimos constituem o
chamado imperialismo).
Pouco a pouco começa a se desenhar
um novo pacto entre o capital e o trabalho, pelo menos nos países
industrializados. Era o fordismo com sua ideia de um “capitalismo popular”.
O Plano Marshall pós Segunda Guerra,
viria ensejar um modelo de intervenção supranacional, pois no lugar de as
potencias imperialistas disputarem entre si os mercados, o que levará a
guerras, buscavam-se: (1) reconstruir e desenvolver a arrasada Europa, (2)
conter a expansão soviética que avançara sobre o Leste europeu, (3)
apresentar-se como uma alternativa política contra a ascensão de grupos e
partidos de esquerda.
Após 1945, teremos os chamados anos
dourados do capitalismo fordista, período que consagrou a denominada sociedade
de consumo de massas.
Desde fins da Segunda Guerra vem
sendo gestado um novo padrão internacional de poder que se configura com a
importância cada vez maior das grandes corporações empresariais transnacionais,
em termos institucionais num conjunto de entidades supranacionais (como a ONU,
FMI, BID e o Bird).
Estava aberto, pois o caminho para
uma financeirização cada vez maior da economia mundial. A partir desse momento,
o dólar passa a ser o novo lastro que os países devem buscar, e somente um
país, os EUA podem emitir essa moeda.
O fordismo como acumulação baseada
na intensificação do consumo e da produtividade (via métodos “fordistas” de
trabalho) e na regulamentação monopolista, centralizadora, seria ultrapassado,
ou melhor, passaria a conviver, a partir dos anos 1980, com o chamado pós
fordismo ou capitalismo de acumulação flexível.
COMPARATIVO DA
MODERNIDADE FORDISTA E PÓS MODERNIDADE FLEXÍVEL
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MODERNIDADE FORDISTA
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PÓS MODERNIDADE FLEXÍVEL
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Hierarquia
– Homogeneidade
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Anarquia
- Diversidade
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Habitação
Pública
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Desabrigados
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Capital
Produtivo – Universalismo
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Capital
fictício - Localismo
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Poder
estatal - capital monopolista – sindicatos
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financeirização
- complexos corporativos empresariais - des-responsabilização social do
Estado
|
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Forte
presença de sujeitos coletivos
|
Desconstituição
dos sujeitos coletivos
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Ética -
Mercadoria-dinheiro
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Estética
- dinheiro contábil
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Produção
– Originalidade
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Reprodução
- Ecleticismo
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Operário
– Vanguardismo
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Administrador
- Comercialismo
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Centralização - Totalização
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Descentralização
- Desconstrução
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Sintese
- Negociação Coletiva
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Antítese
- Contratos Locais
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Produção
em massa
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Produção
de Pequenos Lotes
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Política
de classes
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Movimentos
sociais, grupos de interesse
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Trabalhador
especializado
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Trabalhador
flexível
|
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Reprodução
mecânica
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Reprodução
eletrônica
|
Segundo esses autores (em geral,
cientistas políticos) a guerra, por meio da indústria bélica que a sustenta,
seria o grande dínamo das inovações tecnológicas, o estímulo maior para o
surgimento das novas tecnologias.
Embora os EUA permaneçam como a
grande potência econômica do planeta, visto como Estado-nação, em termos
individuais, a liberalização do comércio e das finanças, aliada ao novo padrão
tecnológico (aquilo que Milton Santos denominou de período e∕ou meio técnico
científico informacional) deu forma a uma “fluidez” ou globalização do espaço
planetário nunca antes vista.
A GLOBALIZAÇÃO
ECONÔMICA NEOLIBERAL
“Desterritorializador” (fluido) e
globalizador inerente ao capitalismo:
·
A
liberação de populações de seus territórios na realização da acumulação
primitiva, criando um proletariado livre;
·
A
unificação em torno do dinheiro, seu equivalente em geral, referencia
quantitativa frente à qual, praticamente tudo passa a ser medido e avaliado;
·
O
estabelecimento de um conjunto de leis “historicamente variáveis imanentes ao
próprio funcionamento do capital”.
Entretanto, é claro que o
capitalismo não corresponde a um processo unilateral e cumulativo de
“globalização”. (...) À medida que parece organizar-se gradativamente uma
espécie de “território mundo” globalmente articulado, o capitalismo se reproduz
contraditoriamente e, sobretudo, difunde a desigualdade, apropriando-se ou
mesmo produzindo a diferenciação, a fim de expandir a lógica mercantil que lhe
é inerente.
A interferência periódica do Estado
é sempre uma “faca de dois gumes” na consolidação da globalização capitalista,
pela contradição que lhe é inerente entre as defesas de interesses públicos e
de interesses privados, que conjuga abertura e fechamento de fronteiras,
“estatismo” e liberalização econômica.
O discurso da desterritorialização
e, consequentemente, de uma globalização irrestrita num mundo efetivamente “sem
fronteiras” vincula-se hoje, em grande parte, aos argumentos políticos daqueles
que defendem o chamado projeto neoliberal.
Durante o domínio do chamado Estado
do bem-estar social ou Estado-previdência (nos países centrais capitalistas), a
partir da Segunda Grande Guerra, o Estado atua também como um agente
redistribuidor de renda, capaz de assegurar não apenas a ampliação do mercado
de consumo pela elevação (relativa) dos salários, mas também alguns benefícios
sociais pelos quais há muito vinham lutando os trabalhadores organizados.
O Estado, como espécie de
intermediário capaz de “pender a balança” para um ou outro lado, aparece como
principal responsável pela políticas “reguladoras” dos conflitos entre o capital
e o trabalho.
Entretanto, nessa fase de
globalização neoliberal, o Estado vai gradativamente perdendo força e deixando
muito maior a liberdade para que as forças do mercado comandem a economia.
A globalização econômica se desdobra
em quatro formas ou dimensões: a comercial, a produtiva, a tecnológica e a
financeira.
A DIVISAO
TERRITORIAL DO TRABALHO E AS NOVAS DESIGUALDADES
Antigas divisões territoriais do
trabalho adquirem outra conformação, muito mais complexa. Inicialmente, a
consideração dos diferentes setores da economia – primário, secundário e
terciário, por exemplo.
Dessa forma, a nova divisão
internacional do trabalho passou a ser baseada não estritamente nos setores da
economia por tipo de produto, mas nos níveis tecnológicos de produção, nas
formas de gestão e nas relações de trabalho dominantes, o que inclui, é claro,
o valor dos salários pagos aos trabalhadores.
Podemos afirmar que hoje, a divisão
territorial∕internacional do trabalho, pautada nos níveis tecnológicos da
produção e nos correspondentes níveis de qualificação (e de exploração) da
força de trabalho, permite diferenciar o espaço mundial identificando:
·
Espaços
que detém o domínio do capital financeiro e dos investimentos na produção e∕ou
o controle das tecnologias mais avançadas e da difusão de informações.
·
Espaços
com certa independência financeira, em que predominam atividades econômicas com
níveis intermediários.
·
Espaços
com grande dependência do capital financeiro internacional, em que a produção é
de baixo nível tecnológico.
Num país com as dimensões e
complexidade do Brasil, o mais justo é analisar não simplesmente a sua
participação na divisão internacional do trabalho, mas também as
especificidades de sua divisão inter-regional do trabalho.
Nesta nova divisão do trabalho,
comandada pela informação, pela biotecnologia e pelo capital financeiro, dois
novos espaços são fundamentais: pelo lado da tecnologia, centros sofisticados
de pesquisa (os chamados tecnopólos), capazes de pensar e∕ou produzir inovações
tecnológicas e de qualificar permanentemente a força de trabalho; pelo lado do
capital financeiro, distritos financeiros sofisticados no interior das
principais “cidades globais”, e paraísos financeiros (ditos offshore) em pontos
estratégicos, a fim de lavarem o dinheiro obtido em operações ilegais cada vez
mais frequentes.
Temos então, a grande importância
adquirida pelo chamado “capital pensante”, que gera inclusive novas formas de
exploração, não só da conhecida forma da “fuga de cérebros”, mas também pela contratação,
a baixos salários, de pesquisadores trabalhando nos seus países de origem, como
aconteceu com a Europa Oriental.
Assim, apesar da crescente
globalização e da dificuldade de identificar a “nacionalidade” da produção de
uma empresa transnacional, a analise econômica pautada nas bases territoriais
dos Estados não perdeu a importância, ainda mais se considerarmos que a maioria
dos dados econômicos ainda é fornecida referente às economias nacionais.
Essa nova era pode também ser
considerada a era das desigualdades.
Em suma, da precarização das
relações de trabalho e a consequente marginalização ou exclusão de um numero
crescente de pessoas, sem lugar no mapa da globalização, seja como massa
política de manobra, seja como trabalhadores ou até mesmo, em situações mais
extremas, como consumidores.
Até mesmo entidades como a
Organização Internacional do Trabalho reconhecem que a globalização acirrou as
desigualdades, aumentando a distancia entre ricos e pobres. A abertura de
mercados e novos acordos comerciais não garantiram a redistribuição da riqueza,
mas a sua concentração. Apenas alguns países, justamente onde não foram
aplicados os programas ortodoxos de abertura dos mercados, como a China, a
Índia e a Coréia do Sul, conseguiram diminuir a miséria; no caso da China,
porem , houve acentuado crescimento das desigualdades entre ricos e pobres.
Outro indicador socioeconômico que
reflete bem o nível de desigualdade planetário é o que se refere às condições
de habitação, mediante o percentual de população favelada.
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