A
UE COMO MEGABLOCO ECONÔMICO
“O
novo rumo da Europa é a consequência da crise radical de todas essas
ideologias. (...) O aspecto apaixonante do que estamos construindo é que vamos
inventar, se é que existem, ideologias inteiramente diferentes.”
Há um paradoxo de base que percorre
a historia da União Européia: embora a iniciativa comunitária e toda a operação
de constituição de um espaço supranacional tenham sido movidas pela
geopolítica, o lastro material do processo foi sempre a economia.
O relativo sucesso, em longo prazo,
do bloco econômico comunitário pode ser avaliado pelo crescimento do seu PIB
conjunto, relativamente ao PIB americano.
O efeito econômico da progressiva
dissolução das barreiras – isto é, a ampliação das dimensões do mercado
consumidor – pode ser avaliado pela participação da União no comercio exterior
de seus integrantes. Todos os 15 exibem, no presente, um perfil de exportações
e importações predominantemente vinculado às zonas comunitárias.
Mesmo as potencias econômicas e
demográficas (...) dependem do mercado comunitário para a realização de mais da
metade de seu comércio exterior.
As metas econômicas estabelecidas no
Tratado de Roma – as chamadas “quatro liberdades”: de circulação de
mercadorias, capitais, serviços e pessoas – foram concretizadas em 1993 com a
constituição do Mercado Comum Europeu. ... assumia um papel de megabloco
econômico, destinado a rivalizar com EUA e Japão.
Fusão
de Soberanias
A União Européia apresenta um traço
essencial: suas relações não são puramente intergovernamentais. Isso significa
que as instituições comunitárias concentram poderes próprios, que independem
dos governos nacionais e aplicam-se diretamente, como força de lei, a Estados,
empresas e cidadãos. A EU possui, em certo grau, o atributo de soberania, que
geralmente pertence com exclusividade ao Estado.
A soberania comunitária deriva de
uma abdicação parcial de soberanias por parte do Estado.
Instituições
Européias
O Conselho de Ministros
O Conselho de Ministros é o órgão
Maximo da EU. Composto por ministros de cada um dos Estados-membros, define as
grandes orientações gerais da EU. (...) Exercem a presidência rotativa, com
mandados de seis meses cada um.
O Conselho decide grande parte das
questões com base na regra de maioria de votos. As questões mais importantes,
porem, dependem da unanimidade.
Estas reuniões ocorrem duas ou três
vezes por ano.
A Comissão Européia
Esse órgão encarrega-se da gestão e
administração cotidiana da EU. É formado por 20 membros, designados pelos governos
dos países membros, para um mandado de 4 anos.
Os integrantes da comissão não
representam seus países, mas apenas os interesses da UE.
O Parlamento Europeu
O Parlamento Europeu passou a ser
formado pelo voto direto dos cidadãos dos países da comunidade em 1979. (...)
Cumpre a função de controle dos atos da comissão, podendo inclusive derrubá-la
com um voto de censura dado por maioria de dois terços.
Os deputados europeus são eleitos
para mandados de cinco anos. (...) Não se organizam por bancadas nacionais, mas
por grupos políticos europeus.
O Comitê Econômico e Social
O Comitê é um órgão consultivo que
emite pareceres sobre grande parte das propostas da Comissão, antes de serem
enviadas para a decisão do Conselho. Formado por 222 membros de entidades
empresariais, sindicatos de trabalhadores, associações de agricultores e
consumidores, funciona como uma câmara de pressão oficial.
O Tribunal de Justiça das
Comunidades
Formado por 15 juízes nomeados de
comum acordo pelos governos, para mandados de 6 anos. (...) Ele pode anular
atos da Comissão, do Conselho ou de um Estado-membro se forem incompatíveis com
os tratados. Também interpreta o direito comunitário em casos controversos, a
pedido dos tribunais nacionais.
O Tribunal de Contas
O Tribunal de Contas controla a
gestão do orçamento da UE. (...) Essas despesas são cobertas por contribuições
nacionais e também por recursos próprios da União, provenientes de impostos e
taxas.
A UE e Os Desequilíbrios Regionais
A União Européia jamais foi um
conjunto homogêneo, sob o ponto de vista das características econômicas e
sociais de seus componentes.
O primeiro tipo de desequilíbrio,
óbvio, mas importante, decorre do peso demográfico muito desigual dos países
membros.
Entretanto, a principal disparidade
entre os membros da União reside nas diferenças de potencial das suas
economias. Uma forma de mensurar essas diferenças é comparar o PIB dos 15.
O PIB total revela o potencial
produtivo e as dimensões do mercado consumidor, mas esconde o nível de vida das
populações e o grau de desenvolvimento das economias.
A análise do consumo energético per
capita é também significativa, pois deixa entrever a presença de vastas regiões
caracterizadas por técnicas arcaicas de produção rural, fundamentadas na força
humana e animal.
A União é considerada um conjunto de
países ricos e prósperos (...) entretanto, a distribuição da riqueza no
interior do espaço comunitário apresenta fortes desigualdades, tantos sociais
como regionais (...) quase 15% da população comunitária se encontra abaixo do
limite oficial de pobreza.
Os espaços periféricos da União são
objetos de uma política de ajuda regional europeia, destinada à adaptação de
suas economias. O Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional financia programas de
adaptação estrutural para as regiões consideradas atrasadas.
As periferias comunitárias são
regiões predominantemente rurais em países ricos. (...) Como regra, as
atividades agropecuárias tradicionais apresentam ainda uma participação
significativa na vida econômica dessas periferias.
A integração dos espaços periféricos
à Comunidade tende a transformá-los em zonas de investimentos industriais
seletivos. O custo relativamente baixo da força de trabalho atrai industrias
baseadas em tecnologias tradicionais e uso intensivo de mão de obra. (...) A Europa dos quinze recria, no seu
interior, espaços de subdesenvolvimento subordinados às estratégias
empresariais decididas no núcleo rico.
A Política Agrícola Comum e as
Negociações do Gatt
A Política Agrícola Comum (PAC)
nasceu em 1962, formada por cotas dos Estados repartidas de acordo com sua
potencia econômica. (...) A França modernizou sua economia rural e tronou-se o
segundo exportador mundial de cereais com base no trampolim comunitário.
A proteção do mercado europeu e a
ajuda direta dos produtores criaram um ambiente propício ao crescimento
acelerado da produtividade agrícola no espaço comunitário. Defendidos das
flutuações de preços do mercado mundial e da concorrência dos tradicionais
exportadores de alimentos, os agricultores comunitários desenvolveram
capacidades produtivas impressionantes.
Na década de 1980, a modernização
acelerada determinou forte concentração regional da produção e ampliou as
disparidades entre os agricultores prósperos e os agricultores tradicionais.
(...) A intensificação da produção e a mecanização agrícola provocaram forte
despovoamento de zonas rurais, alem de degradação ambiental e redução de
qualidade dos produtos.
Os agricultores adaptaram –se as
reformas restringindo o plantio de cereais e a produção de laticínios, mas
ampliando as culturas de oleaginosas (soja e girassol) e os rebanhos bovinos de
gado de corte.
A guerra de mercados agrícolas
intensificava-se com a estagnação da demanda, motivada pela saturação dos
países ricos e pelo impacto da recessão econômica internacional sobre os países
pobres. Em consequência, os preços apresentavam tendência ao declínio e
ampliavam-se as reservas de alimentos nos países exportadores. Essa conjuntura
foi responsável pela intensificação das políticas de “ajuda alimentar
permanente” aos países africanos, acarretando desorganização das produções de
mercado interno na África e dramatizando a dependência alimentar do continente.
A guerra agrícola entre a CE e os
EUA tornou-se o foco das negociações comerciais multilaterais abertas pelo
Acordo Geral de Tarifas e Comercio (GATT).
Em maio de 1992, sob forte pressão
americana, a CE deflagrou um programa de reforma ampla do PAC.
A reforma não diminuía o nível total
de subsídios ao setor agrícola, mas os redirecionava. Em vez do aumento da
produção e da produtividade; os subsídios deveriam ajudar a conter a produção e
reduzir os desníveis sociais e regionais no campo.
O
Mercado Único Europeu
O Grande mercado interno é um
conceito baseado nas chamadas ‘quatro liberdades’.
A realização dessa meta foi
organizada em torno do Livro Branco Europeu, um conjunto de 282 medidas
isoladas, definidas pela comissão em 1985 como essenciais para o mercado comum.
Essas medidas envolviam basicamente, a harmonização dos impostos e taxas
nacionais, a desburocratização das normas de transporte entre países, a
eliminação de formalidades alfandegárias e a supressão dos controles de
passaporte incidentes sobre os cidadãos da CE.
A Europa erguia um muro invisível
contra os imigrantes, enquanto prometia a total liberdade para os europeus.
Aos naturais da União (pessoas
nascidas nos países membros) ficam assegurados os direitos de circulação
previstos. Já os demais residentes ficam impedidos de mudar livremente de país
de residência no interior do espaço comunitário.
Se a circulação de pessoas está
fundada na discriminação, o mesmo não ocorre com a circulação de capitais e com
os investimentos. A remoção das barreiras entre os Quinze tende a acelerar o
processo de integração industrial da União.
Em vez de fusões e aquisições
intracomunitárias, ocorrem principalmente associações entre conglomerados
nacionais (franceses, alemães, britânicos...) e parceiros americanos ou
asiáticos. Através dessas associações as megaempresas mundiais ingressam no
espaço comunitário europeu e beneficiam-se das vantagens da remoção das
barreiras econômicas nacionais.
O welfare State (Estado de Bem Estar
Social) consiste num conjunto de medidas sócio econômicas destinadas a promover
a redistribuição da riqueza, reduzindo os contrastes de renda típicos das
economias de mercado. São medidas nos campos de previdência, segurança, no
emprego, educação e saúde, voltadas para a criação de proteções contra a
pobreza e a exclusão social.
A integração europeia avançou
paralelamente ao processo de descolonização afro-asiática. Esses dois eventos
não são apenas concomitantes: subordinam-se a mesma conjuntura histórica. A
Guerra Fria, ambiente marcado pela bipolaridade do poder planetário, foi o
cenário estratégico tanto da unificação da Europa ocidental quanto da ruptura
dos laços coloniais que prendiam os territórios afro-asiáticos às potencias
europeias.
MAGNOLI,
Demétrio. A UE como Megabloco Econômico. A União Européia: história e
geopolítica. São Paulo, Moderna, 1995, p 43-62.
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