terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Contemporaneidade, Educação e Tecnologia - Fichamento


Contemporaneidade, Educação e Tecnologia
Antonio Flavio Barbosa Moreira
Sonia Kramer

Introdução
                A globalização tem afetado o modo de estruturar a educação escolar e desenvolver o trabalho docente. Implicada nesse processo (...) está a revolução científico-tecnológica, cujos reflexos também de notam nas salas de aula (Barreto, 2002). Pág. 02
                (...) Qualidade na educação passa a corresponder ao emprego, nem sempre criativo e eficiente, de recursos tecnológicos que promoveriam a atratividade dos ensinamentos “oferecidos” aos alunos ou por eles apreendidos sem uma interferência significativa do∕a professor∕a. Pág. 02

O Processo de Globalização e Seus Efeitos na Educação
                Entendendo-se a globalização como um fenômeno multifacetado, com dimensões econômicas, sociais, políticas, culturais, religiosas e jurídicas interligadas de forma complexa (Sousa Santos, 2002), vale examinar que consequências tal processo provoca na educação. Em primeiro lugar, as modificações na esfera do trabalho ... se refletem no redimensionamento do trabalho pedagógico. Pág. 04
                Na educação, o comportamento flexível é tanto demandado dos professores quanto difundido, como habilidade a ser adquirida, aos estudantes, futuros trabalhadores. (...) Deseja-se um professor disposto a correr riscos e a investir em sua atualização. Pág. 05
                Em segundo lugar (...) o pensamento empresarial parece contaminar os movimentos de reforma, objetivando estruturar as escolas conforme o modelo das corporações contemporâneas. Pág. 05
                A escola é concebida como um negócio, a inteligência é reduzida a instrumento para o alcance de um dado fim e o currículo é restrito aos conhecimentos e às habilidades empregáveis no setor corporativo. Pág. 05
                Em terceiro lugar, busca-se a homogeneização cultural, em inúmeros países, com o recurso ao estabelecimento do conhecimento oficial. O que conta como conhecimento legítimo e o direito de determiná-lo definem-se com base em uma complexa política de controle simbólico do conhecimento público (Apple, 1993). Em algum nível governamental, situam-se os encarregados de criar uma “tradição seletiva” no país e de formar “a própria consciência da sociedade”. Pág. 05
                (...) o conhecimento oficial acaba correspondendo a um conhecimento negociado, filtrado através de um intrincado conjunto de telas e decisões políticas. (...) Elementos de homogeneização e de diferenciação terminam por coexistir, em meio a atritos e tensões. Pág. 06
                Em quarto lugar, louvam-se, no discurso pedagógico, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC). Pág. 06
                Atribuem-se múltiplos sentidos à presença das TIC no ensino, vistas como contribuindo para que: se superem os limites das “velhas tecnologias”; se solucionem problemas pedagógicos com que o professor se depara; ou, ainda, se enfrentem questões sociais mais amplas. É como se as TIC fossem dotadas de poder miraculoso. Nessa perspectiva, deixam de ser vistas como fontes de transformações que consolidariam a sociedade da informação ou do conhecimento. Pág. 06
                (...) Não se pode negligenciar a presença, na sociedade, de distintas formas de diversidade cultural. Se algumas são antigas, como a que resulta da religião, outras se associam à modernidade, como as diferenças existentes entre classes sociais relacionadas à industrialização. Nesse sentido, o caráter democrático de uma sociedade do conhecimento requer políticas públicas internacionais, nas quais se encontrem numerosas línguas, etnias e culturas, bem como condições discursivas e contextuais que favoreçam a preservação e o aprofundamento de variadas tradições de conhecimento. Pág. 06 e 07
                (...) A expansão uniformizada de aparatos tecnológicos não elimina a diversidade das relações sociais entre indivíduos, assim como as relações desses indivíduos com o conhecimento, com o dinheiro e com seus corpos. Tampouco propicia o desaparecimento de desigualdades econômicas. Pág. 07
                Em quinto lugar, o esforço para padronizar os processos educativos é acompanhado por resistências, adaptações e interpretações locais comprometidas com valores não hegemônicos, como por exemplo, a defesa da escola publica. Pág. 07
                (...) Parece haver espaço para que, nas práticas pedagógicas, se escolham objetivos e procedimentos, oriundos “de baixo”, dos grupos subalternizados, excluídos e marginalizados, que desestabilizem os processos hegemônicos. Pode também haver espaço para que se desafiem os modos usuais de prescrição de políticas e de promoção de mudanças nos sistemas educacionais. Pág. 07

Sobre Qualidade e Relevância na Educação
                Algumas visões de educação de qualidade ... priorizam: desempenho satisfatório em exames nacionais; domínio de conhecimentos, habilidades e competências que se estabeleçam previamente; emprego de tecnologias avançadas; supervalorização da competitividade e da produtividade; novos métodos de gerenciamento de sistemas e instituições educacionais; procedimentos integrados e flexíveis no trabalho pedagógico. (...) Todavia, não se ultrapassa o nível instrumental quando a noção de qualidade se funda apenas em pressupostos técnicos e se distancia dos juízos de valor, do compromisso com a justiça social, bem como das ações e dos interesses dos sujeitos que concretamente a define e adota. Pág. 07 e 08
                O conceito de qualidade é historicamente produzido, não cabendo, portanto, pensa-lo em termos absolutos. (...) Trata-se, em síntese, de concepção formulada com base em um arbitrário sócio cultural e norteada por demandas distintas e mutáveis (Franco, 1992). Pág. 08
                (...) Avalos (1992) que se concentra na realidade do Terceiro Mundo ... discute qualidade do ponto de vista do desenvolvimento dos indivíduos e da sociedade. Uma educação de qualidade, ao seu ver, capacita o indivíduo a se mover da situação de viver restritamente seu cotidiano, para tornar-se ativo na mudança de seu ambiente. Pág. 08
                O conhecimento escolar apropriado é o que possibilita ao estudante tanto um bom desempenho no mundo imediato quanto a analise e a transcendência de seu universo cultural. Pág. 08
                (...) Educar envolve o respeito, a critica e a ampliação de horizontes e de tradições culturais. (...) sugere, então, conteúdos e experiências escolares que concorram para formar sujeitos autônomos, críticos e criativos, capazes de compreender como as coisas são, como assim se tornaram e como podem ser transformadas por ações humanas (Avalos, 1992). Pág. 09
                Garantir uma escolarização consistente com o direito à educação requer diagnosticar o sistema, definir as mudanças prioritárias e viáveis, assim como oportunizar financiamentos que acelerem as mudanças. Pág. 09
                (...) é indispensável ... analisar a influencia de fatores como o capital econômico e o capital cultural das famílias e dos alunos. Em resumo, é preciso considerar, na análise da qualidade, tanto fatores externos à escola, quanto fatores específicos à essa instituição. Pág. 09
                O baixo nível cultural e socioeconômico do aluno pode levar o professor a apresentar baixas expectativas, em relação ao seu desempenho. Ainda: em decorrência de suas expectativas, os professores tendem a interagir de modos distintos com os alunos. O resultado é um menor numero de oportunidades, na escola, para os alunos, sobre os quais as expectativas são inferiores. Pág. 09 e 10
                A promoção de uma educação de qualidade depende de mudanças profundas na sociedade, nos sistemas educacionais e na escola. Nesses dois últimos, exigem-se: condições adequadas ao trabalho pedagógico; conhecimentos e habilidades relevantes; estratégias e tecnologias que favoreçam o ensinar e o aprender; procedimentos de avaliação que subsidiem o planejamento e o aperfeiçoamento das atividades pedagógicas; formas democráticas de gestão da escola; colaboração de diferentes indivíduos e grupos; diálogo com experiências não formais de educação; docentes bem formados (que reconheçam o potencial do aluno e que concebam a educação como um direito e um bem social). Pág. 10
                Uma concepção renovada de qualidade, inclui a crença tanto em uma escola reformulada e ampliada, quanto em uma ordem social menos desigual e excludente. Pág. 10

Sobre Tecnologia e Escola
                (...) Lyotard (1998) concebe, na sociedade do conhecimento, o pós-modernos como o fim das narrativas empolgantes, substituídas por narrativas modestas. No mercado mundial, as desigualdades são agravadas, inclusive pelo desenvolvimento das tecnologias. Já Baudrillard (1993, 1995) denuncia os simulacros e o êxtase da comunicação, em uma hiper-realidade onde não há mais originais: a imagem do individuo – um terminal de redes múltiplas – é a imagem do desespero. A cultura é extinta pela mídia. Pág. 12
                Numa linha otimista, Lévy (1993, 1999) entende a informática como tecnologia intelectual que engendra novo modo de pensar o mundo, de entender a aprendizagem e as relações com esse mundo. Pág. 12
                Fim da cultura, morte da comunicação, desespero ou possibilidade? Para além do pessimismo ou do otimismo, o que parece mais perigoso é a renuncia ao reconhecimento de que há mudanças e novos aparatos tecnológicos que formam e informam uma geração. A exclusão educacional se articula com mecanismos de discriminação social, racial, sexual e regional, o que constitui ponto de partida para um debate consequente sobre a tecnologia (Ramal, 2002). Ou seja, ao lado da incorporação da tecnologia, cabe questionar o modelo de sociedade que se quer construir. Pág. 12
                Ramal propõe três cenários para a educação no que se refere à tecnologia. O primeiro é o da tecnocracia domesticadora: a multiplicidade de informações efêmeras e fragmentadas torna os indivíduos escravos ambulantes da tecnologia. A escola é substituída por outras modalidades de instrução. O segundo é o do pay-per-learn, que acentua a exclusão (...). Há educação para todos, pela rede, ainda que os alunos privilegiados frequentem escolas melhor equipadas. No terceiro cenário – cibereducação integradora -, a escola se torna hibrida, integrando homem e tecnologia. O homem se educa criticando e transformando o meio, tendo em vista critérios que promovam sua humanidade, num processo que Ramal identifica como tecnologias da liberdade. Pág. 12 e 13
                Discussões sobre as tecnologias ... precisam considerar as formas de apropriação dos meios digitais por crianças e jovens. Pág. 13
                (...) as novas tecnologias (o computador em particular a internet), alterando as condições e os meios, ampliam o acesso à leitura e modificam as formas de produção da escrita (Chartier). De um lado, a mídia favorece maior número de leitores e de escritores e as tecnologias atuam no sentido da democratização e da inclusão e não apenas da discriminação e da exclusão. Pág. 13 e 14
                (de acordo com Chartier, a produção de livros tem sido ofuscada pela produção de textos, que podem ser agregados á publicações de acordo com o intuito do editor, mas põe em cheque a confiabilidade da escrita, essa seria a maior transformação nos modos de produção da escrita e praticas de leitura)

Qualidade na Formação: Desafios Para Professores e Gestores
                (...) O trabalho high tech ... também agrava a degradação das relações, acentua a alienação, a indiferença e a falta de identificação com o trabalho. Pág. 14 e 15
                (...) É possível formar pessoas na perspectiva de construir solidariedade, autonomia e respeito mútuo em sociedades onde inveja, talento e velocidade de produção individual são a meta? Pág. 16
                Compreender – estabelecer diálogo – é desafio nos mais variados planos de produção humana, seja em relação ao conhecimento, à arte ou  à vida cotidiana (...). No que diz respeito à atuação dos professores, gestores e pesquisadores do campo educacional, em relação aos três planos – o cognitivo, o estético e o agir ético – cabe: (a) responsabilidade, o que significa assumir, como intelectuais, papel ativo na compreensão dos processos implicados na educação e na escola, bem como dos fenômenos sociais contemporâneos em sua complexidade, e (b) responsividade, o que significa catalisar a capacidade de dar respostas, ainda que provisórias , e delinear ou propor discursos e percursos alternativos para uma educação de qualidade. Responsabilidade e responsividade com relação à educação, entendendo professores e gestores como intelectuais, demandam repensar s processos de formação desses profissionais. Pág. 17
                Conceber professores e gestores como intelectuais contribui para repensar a escola, a formação e a tecnologia, de modo que a construção de narrativas das historias de vida seja o objetivo. Permite que novos conhecimentos (adquiridos ou construídos) se enraízem nas trajetórias vividas. Ao fazê-lo, concorre para que a vida se torne legível, compreensível, percebida na sua dimensão de longo prazo, em que é possível conhecer e reconhecer o outro e, portanto, é possível o sentimento de “nós”. Induz, também, a tecnologia ... a tornar-se instrumento de narração e de estruturação de grupos e projetos. Pág. 17

A Título de Considerações Finais
                O presente texto refletiu sobre a escola, a tecnologia e a formação de professores no mundo contemporâneo. Enfatizou a necessidade de rever e reverter práticas em que os professores se tornam subordinados a métodos, discursos oficiais, receituários pedagógicos ou equipamentos tecnológicos. Ressalte-se a importância de que a profissionalização docente se consolide, de um lado, com ganhos reais em termos de planos de carreira e salários e de outro, com uma formação intelectual, entendida como formação cultural e cientifica, Trata-se de assumir responsabilidade social perante gerações de crianças, jovens e adultos sistematicamente expropriados de seus direitos. Para tanto, destinação de recursos públicos, ética, vontade política e respeito à liberdade continuam fundamentais. Pág. 18
                Numa conjuntura econômica e política, em que a transformação no mundo do trabalho e o desemprego agravam a estrutura social, marcada por desigualdade e injustiça social, processos de formação alternativos podem desencadear mudanças voltadas para a emancipação. A tecnologia pode ser um instrumento a serviço ou contra esse projeto. Pág. 18
                Nesse texto, foram analisados desafios para os quais não se encontram ainda, respostas definitivas. No entanto, em uma perspectiva crítica, formular perguntas é uma das ações mais importantes da condição humana. Pág. 19

Referência Bibliográfica
Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 – Especial, p. 1037 – 1057, out. 2007

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