A cidade surge a partir do
momento que o campo passa a produzir o excedente alimentar que pode atender à
demanda da cidade. Por não produzir alimento para seu próprio sustento, a
cidade é dependente do campo que, por sua vez, sendo produtor de seu próprio
sustento, pode existir independente da cidade. Alem desta dependência do campo,
a cidade também se caracteriza pela concentração de poder e pela clara
distinção entre classes sociais.
Mesmo
o campo sendo o precursor e mantenedor da cidade, torna-se também dependente
dos serviços recebidos em troca da produção, tais como proteção e religião.
A
relação de exploração que a cidade impõe ao campo reflete na divisão de classes
dentro da cidade, a exploração das classes dominantes que definem os processos
de produção e apropriação distribuídos sempre de forma desigual.
A
origem das cidades remete à origem das classes sociais, onde os dominantes aos
poucos foram deixando as suas funções (cléricos, guerreiros e nobres) para administrar
e explorar a produção de seus servos propositalmente instalados em moradias ao
seu redor. Em outras palavras, havendo o excedente alimentar, uma parcela da
população, no caso os dominantes, conquistaram o ócio necessário para que se
ocupassem apenas das tarefas político-administrativas.
O
agrupamento de pessoas em pequenos espaços organizados, permitia à cidade,
convertendo o excedente alimentar em sustento da força militar, condicionar e
preparar os soldados que garantia o domínio político do território (defesa)
assim como incumbiam-se da conquista de novos territórios aumentando a área de
poder e influencia dos dominantes.
Os
guerreiros e sacerdotes assumem posição de domínio e as ofertas, com o tempo
passam a ser obrigatórias, convertendo-se em impostos.
A
princípio, propunha-se que a cidade tivesse surgido ao redor do mercado com
fins comerciais, mas essa ideia não tem fundamento porque na verdade ocorreu o
contrário, ela surgiu antes, dando amparo aos mercadores que faziam o trajeto,
abrigando-os e protegendo-os.
Com
a cidade, surge a produção regular e especializada de bens mais sofisticados
que aos poucos, através do intercambio originam a moeda que acentua a divisão
social do trabalho sendo também uma importante semente para o capitalismo.
Quando
a cidade se transforma em centro de produção acarreta uma luta de classes, onde
a nova classe dominante transforma o valor de uso em valor de troca, ou seja,
mercadoria. Com o êxodo rural cada vez mais acentuado, surge uma nova classe de
produtores urbanos. Enquanto isso, no campo, o produtor é separado de seus
meios de subsistência de modo que se vê obrigado a produzir valores de troca
para, através de compra e venda, poder adquirir o que precisa para viver. Vale
lembrar que outro importante motivo para que o camponês aumentasse sua produção
eram as taxas e impostos cada vez mais altos. Alguns camponeses chegaram a
perder suas terras de modo que, ou viravam escravos ou migravam para a cidade,
onde se tornava um assalariado. Mesmo além disso, ele também foi seduzido pelos
produtos manufaturados e sua intenção era ter cada vez mais produção para levar
ao mercado, onde através de troca teria acesso a essas manufaturas.
A
revolução urbana, a concentração de pessoas requer uma expansão da divisão do trabalho
através da especialização dos ofícios para atender a demanda, que não se
restringe somente aos limites da cidade.
A
cidade vai acumulando diferentes modos de produção conflitantes, entre diversos
outros fatores, surge uma classe de comerciantes banqueiros: o estopim para a
revolução comercial. Nisso, a burguesia querendo se consolidar sobre as demais
classes teve uma grande responsabilidade.
“A posição e os privilégios de cada mestre se
baseavam na observância das mesmas e imutáveis técnicas de produção. Deste
modo, limitava-se o numero de mestres e excluía-se a competição entre eles.
(...) isso limitava severamente o volume dos produtos colocados à disposição do
mercador.”
“Encontrava-se
assim a burguesia comercial, entre duas barreiras: o monopólio sobre o
excedente alimentar (...) e o monopólio sobre a produção manufatureira. (...) A
servidão no campo (...) liberava mão de obra nas aldeias, que o comerciante
passou a aproveitar na produção de manufaturas. Surge assim, a indústria
doméstica (...) sem estar sujeito à regulamentação corporativa, cuja vigência
se limitava à cidade. É a Revolução da Manufatura que se dá fora da cidade e
contra a cidade.”
Isso
nos trás o comércio, a concorrência e, por fim, o capital comercial.
A
Revolução manufatureira conquistou e tomou a cidade a partir da aldeia. Ao
contrário, a Revolução Industrial nasceu na cidade, com o investimento no
instrumento de produção e não na matéria prima ou na mão de obra. Os antigos
produtores manufatureiros não detinham mais seus próprios instrumentos de
produção e também não mais dominavam a confecção de um produto do início ao
fim. A meta da Revolução é a valorização do capital, tanto o fixo como o
circulante, dando sempre preferência à técnica de produção de menor gasto para
obter um lucro maior na venda do produto final. Como resultado, surgem as
fábricas modernas, equipadas com maquinas que requerem um grande numero de
trabalhadores e infraestrutura adequada, portanto, só poderia se dar na cidade.
A fábrica que não nascia dentro da cidade, acabava por originar uma ao seu
redor por estes motivos.
A
Inglaterra desponta nessa revolução devido ao seu mercado externo, cuja demanda
exigia a produção em larga escala. As demais nações começam a despontar no
cenário do comercio internacional em meados de 1875. Surgem nesse período os
países subdesenvolvidos, que foram aqueles que não atingiram o desenvolvimento
através da concentração da produção e domínio das técnicas produtivas
industriais em seu território.
O
reflexo da industrialização no campo tornou o produtor rural um mero produtor
especializado que, deixando de produzir todos os meios de subsistência, focado
na produção de uma única cultura, passa a consumir cada vez mais os produtos
industrializados da cidade. Em contrapartida, o advento tecnológico da
industrialização no campo permitiu um aumento formidável da produção, ou seja,
nos países industrializados, o campo foi integrado à industria.
“Os ensaios que se seguem tratam dos
problemas da urbanização no contexto do desenvolvimento. Todos eles têm, como
traço teórico comum, um enfoque globalizador: a problemática urbana só pode ser
analisada como parte de um processo mais amplo de mudança estrutural, que afeta
tanto a cidade como o campo, e não se esgota em seus aspectos ecológicos e
demográficos. Na verdade, hoje mais do que no passado, estes aspectos não
passam de uma primeira aparência de um processo mais profundo de transformação
da estrutura de classes e dos modos de produção em presença. É por isso que a
análise do processo de urbanização não passa, muitas vezes de uma abordagem
inicial que é obrigada a superar seu próprio tema se, de fato, deseja
elucidá-lo. Portanto, quando se pensa em urbanização numa sociedade que se
industrializa, é preciso procurar pelo papel que as classes sociais desempenham
nela, pois em caso contrário, ela tende a ser tomada como um processo autônomo,
fruto de mudança de atitudes e valores da população rural, perdendo-se de vista
o seu significado essencial para o conjunto da sociedade.”
SINGER, P.I. À Guisa de
Introdução: Urbanização e Classes Sociais. São Paulo: Brasiliense, 1990. 12ª
ed. P. 11-28. In: Economia Política da Urbanização.
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